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VAMOS ACREDITAR?
A abstenção ganhou as eleições na Europa. Não, isso não é uma contradição com o título desta crónica.
Há um dado novo nestas eleições europeias: pela primeira vez desde 1979, aquando da primeira dessas eleições, a participação aumentou em termos percentuais. Um aumento diminuto, é certo:
43,09% de participação contra 43% em 2009. Desde 1979, essa percentagem vinha sempre a descer: 61,99; 58,98; 58,41; 56,67%; 49,51%; 45,47% e 43% em 2009. Mudança de tendência? Veremos, mas não se pode dizer que seja um resultado encorajador.
Segue-se que, e sem contradição com a afirmação anterior, a direita ganhou as eleições na Europa. Por pouco, mas ganhou. O PPE continua a ser o maior grupo político no Parlamento Europeu. Por pouco, mas é. O problema é a instituição ter-se tornado mais difícil de governar, governo que decorre das regras estatutárias e da composição das respectivas forças, isto é, dos grupos políticos que a integram. Senão, vejamos:
Em 751 deputados, o PPE fica com 214. Os socialistas têm 189. Os liberais 66, logo seguidos dos verdes, com 52. A esquerda unitária europeia terá 42 e os conservadores e reformistas 46. A partir daqui… está tudo (ou quase) em aberto. Dos grupos existentes, sobra o da liberdade e democracia, onde se concentram actualmente os eurocépticos e que teria, mantendo-se a actual estrutura e relação com os partidos nacionais, 38 membros. Mas há 41 não inscritos – por analogia com a situação existente – e sobretudo 63 novos eleitos de partidos que não pertencem a qualquer um dos grupos existentes. Como se repartirão eles? Juntam-se aos eurocépticos do EFD ou criam um novo grupo (pelo menos 25 deputados de 7 países distintos)?
Os partidos políticos tradicionais foram castigados pelo eleitorado. Aconteceu em França, no Reino Unido, na Grécia (o Pasok!), em Itália, Espanha e, claro, Portugal, entre muitos outros. As pessoas buscam alternativas, querem ser ouvidas, refugiam-se em novas propostas, novos rostos e vozes, contra o cansaço dos habituais protagonistas, sempre os mesmos, com mais ou menos variações, sempre a dizer o mesmo, com mais ou menos honestidade. Mas fica, infelizmente, a convicção de que se generalizou a ideia de que as promessas eleitorais são só isso, sem qualquer correspondência com a prática (governativa) futura e que, por isso, não vale a pena escutá-las. Os partidos políticos tradicionais, se não querem passar de tradicionais a extintos, têm de conseguir rapidamente mudar as suas práticas, o seu discurso e a sua imagem. Não é fácil. Mas precisamos deles, a democracia precisa de partidos (o que não precisa é de facções, revisitem sff os federalist papers da revolução americana para uma explicação sobre a diferença).
Segue-se, como próxima grande questão que definirá o verdadeiro papel do Parlamento Europeu na relação entre as instituições europeias, a decisão sobre o próximo Presidente da Comissão Europeia. Caso este venha a ser um dos dois propostos pelos principais vencedores das eleições – os socialistas ou o PPE, o mesmo é dizer Shulz ou Juncker -, o Parlamento terá marcado uma forte posição perante o Conselho e os líderes dos Estados-membros. Se, como aparentemente pretendem alguns desses chefes de Estado e de governo, com o notório caso de Merkel, o escolhido do Conselho Europeu for diferente desses dois e o Parlamento o aprovar, então (atrevo-me a dizer), a posição dos eurodeputados ficará muito enfraquecida, dificilmente podendo resistir ao avanço das pulsões intergovernamentalistas, nacionalistas e soberanistas.
Os partidos extremistas surpreenderam em inúmeros países, como a França – um choque, a grande vitória de Le Pen -, Reino Unido, Dinamarca, Grécia (neste caso, com uma orientação diferente ideologicamente, pois se trata de um partido de esquerda, o Syriza). Noutros, contudo, como a Holanda, até retrocederam. Quase todos esses partidos são anti-União Europeia, com a notável excepção da Alternativa para a Alemanha que, embora com um resultado razoável de 6,5%, se diz sobretudo opositor do euro; alguns são manifestamente xenófobos, pretendendo erguer barreiras aos imigrantes, ou mesmo aos cidadãos da própria União – e as vozes nesse sentido chegam até de políticos supostamente mais moderados como… Sarkozy, o que demonstra a que ponto está o mainstream assustado com a erupção dos extremos e como, no pior reflexo possível, mima as suas propostas, quando não chega a ultrapassá-las. Parece haver mesmo até partidos próximos de orientações fascistas ou nazis, o que devia preocupar toda a gente.
Eleições europeias? Foram-no pouco. O futuro é dos radicais? Citando um dito cuja autoria não recordo conheço muitos radicais (feitos) ministros, nenhum ministro radical; tenhamos esperança. A história repete-se? Claro, como farsa que não deixará de se tornar em tragédia. Mas ainda há tempo de mudar:
Para que isso seja possível, os responsáveis políticos devem moderar as suas ambições pessoais. Entender de uma vez por todas a mensagem dos cidadãos. Reformar o sistema político, em particular no que toca ao exercício do poder, à escolha dos representantes, à participação das pessoas nas decisões, à transparência destas. Devem servir, não servir-se.
Duas frases, a esse respeito, do ilustre senhor de Talleyrand: “a política não é senão um modo de agitar as gentes, antes de se servirem dela” e “quem não tem os recursos para as suas ambições tem todas as preocupações”.
Sobre a União Europeia, numa frase: é preciso acreditar. Ela representa o principal obstáculo contra o regresso a um passado que devemos rejeitar com temor e desdém. Afinal, a maioria ainda é favorável à integração europeia.
Vamos acreditar.
Rumores: o próximo Presidente da Comissão Europeia
O que dizem as minhas fontes, directamente de Bruxelas e próximas dos grupos políticos?
- Que Juncker não será, em qualquer caso, o próximo Presidente da Comissão Europeia
- Que o antigo primeiro-ministro luxemburguês, veterano das instituições europeias, presidente do eurogrupo durante anos, grande amigo de Portugal, estará mais interessado noutro lugar (o de um tal senhor Rompuy, já ouviram falar?)
- Que nesse caso, Martin Schulz, mesmo que os socialistas não se tornem a maior força do Parlamento (isto é, se não vencerem as eleições, mas uma coisa e outra não são a mesma coisa), pode tentar obter uma maioria na Assembleia, com o objectivo de ser o próximo Presidente da Comissão
- Coisa que, naturalmente, não será nada agradável para o senhor Cameron ou para a senhora Merkel.
Será verdade?
Enquanto isso, na Bélgica…
(tradução livre do texto em inglês, enviado pelo meu correspondente e amigo na Bélgica, Rolf Falter, com agradecimentos)
“As eleições europeias na Bélgica desenrolam-se à margem das eleições nacionais. Por isso, não há um grande assunto em discussão.
Quanto à participação: o voto é obrigatório na Bélgica, por isso não se espera uma baixa participação (embora cerca de 10% do eleitorado fique em casa e sendo impossível levar todos a tribunal, ninguém é julgado por isso). Como sabem, temos partidos e distritos eleitorais separados na Flandres, Valónia e na pequena comunidade alemã. Agregadamente, contudo, e em termos de mandatos, espero os seguintes resultados:
Um status quo para o PPE e os liberais (ambos com 5), a perda de um lugar para os Socialistas. 3 lugares em vez de 4 para os Verdes, pois tinham um membro nos nacionalistas flamengos. Estes terão provavelmente 3 membros no próximo Parlamento, provavelmente em ocnjunto com os conservadores britânicos (nada de oficial, por enquanto, mas todas as opções estão em aberto). A extrema direita do Vlaams Belang (grupo dos não inscritos) diminuirá de 2 para 1. E partido LDD, com um um membro no Grupo dos Conservadores e Reformistas, desaparecerá.
Os liberais estão vulneráveis e podem acabar com 4 membros, ficando o PPE, com sorte, com 6 deputados. Os socialistas podem até perder um segundo mandato, caso a extrema esquerda faça um bom resultado na Valónia.”
Texto original:
“The European elections in Belgium are taking place in the margin of the national elections. So no big issue at hand. As for the participation: in Belgium voting is obligatory, so no low participation expected (although about 10 % of the electorate stays at home and it is of course impossible to bring all of them,to justice, so nobody is). As you know we have separate parties and electoral districts in Flanders, Wallony and the small German community. But on aggregate, and in seats, I expect the following results: a status quo for epp and alde (both 5), a loss of one seat for S&D. 3 seats instead of 4 for Greens/EFA because they had one member of the Flemish nationalists. These Flemish nationalists will probably be with 3 in the next EP and are likely to go together with the British Tories (nothing official yet, so all options are open). The extreme right Vlaams Belang (group of non-attached) will go from 2 to 1. And the LDD party, who had one member in the ECR, will disappear. The liberals are vulnerable, and could end up with 4, the EPP with 6 with some luck. the socialists could even lose a second seat if the extreme left makes a big gain in Wallony.”
AS ELEIÇÕES EUROPEIAS COMEÇAM AMANHÃ: ESTADO DA ARTE
Pois é, caros amigos da Euratória, as eleições para o Parlamento Europeu iniciam-se amanhã e depois, no Reino Unido e na Irlanda, respectivamente. Algumas informações sobre a sua realização e divulgação de resultados, recebida dos meus amigos e correspondentes locais:
No Reino Unido, as urnas estarão abertas entre as 07h00 e as 22h00 de quinta-feira (amanhã), mas os resultados só começarão a ser conhecidos no domingo à noite. Na Irlanda, as eleições europeias terão lugar na sexta-feira dia 23 de Maio no mesmo horário. A contagem iniciar-se-à no domingo à noite.
Actualizando informações:
Tudo indica que a participação será baixa em geral (+/- 44%). Infelizmente, se se confirmar este valor, estaremos muito próximo do mínimo histórico de 2009 (43%) e nem o facto de pela primeira vez, desde 1979, haver um aumento da participação em percentagem, poderá servir de consolo. Afinal, os europeus não se sentem assim tão entusiasmados com a possibilidade de escolher o Presidente da Comissão Europeia? Ou será antes que não lhes foi bem explicado o significado dessa escolha, em campanhas eleitorais mais a olhar para os umbigos (nacionais) do que para a dimensão europeia (não foi só em Portugal)?
Seja como for, prevêem-se taxas muito baixas de participação em França (39%), Suécia (27%), Eslovénia (25%), Polónia (23%) e Eslováquia, uns incríveis 20%!
E Portugal? Veremos. O recorde de abstenção data de 1994 (com 65,4%), logo seguido das recentes eleições de 2009 (com 63,2%, isto é, uma taxa de participação de 36,8%). Muitos analistas apostam num resultado parecido ou semelhante. Seria um ainda maior fiasco, considerando que as eleições europeias em Portugal se realizaram todas em datas próximas do 10 de Junho e dos feriados da época, justificação que nem sequer se poderia utilizar desta vez. Culpar quem, afinal? Escuso-me naturalmente a repetir a frase que acima usei (campanhas eleitorais mais a olhar para os umbigos (nacionais) do que para a dimensão europeia) e limito-me a pedir que avaliem bem o conteúdo dos argumentos, intervenções, discursos e debates entre candidatos de todos os quadrantes – e depois decida cada um de acordo com o respectivo juízo.
Mas, como disse, veremos.
Agradecimentos ao John Edward e Bjorn Kjellstrom, na Escócia e Inglaterra, Dermot Scott, na Irlanda, e Natasa Gorsek.
Um “cheirinho” da campanha na Europa
Da minha correspondente Natasa Gorsek, uma análise sobre a natureza da campanha nalguns Estados-membros. Eis a tradução livre do texto (escrito originalmente em inglês):
“A nossa análise mostra grandes diferenças entre os Estados-membros relativamente à intensidade da campanha. A crise Rússi/Ucrània teve maior relevância nos media na última semana – nalguns países (Alemanha, Bulgária, Estónia, Letónia) com sentimentos pró-russos. É interessante verificar quais são os principais tópicos do debate: na Dinamarca, o turismo do bem-estar e o dumping social, na Holanda a preservação do modelo social europeu, a imigração na Itália, na Irlanda as críticas do Sinn Fein ao consenso de Bruxelas, no Chipre a recuperação económica e os acontecimentos na Síria, Turquia, Ucrânia, a Finlância contra os cortes nas despesas, na Suécia a questão dos cidadãos de origem cigana, fortes ataques a Merkel e aos falcãos da austeridade em Espanha”. O mesmo acontecendo em Portugal, acrescento eu.
Eis o texto original:
“Our analysis shows big differences among MS in the intensity of campaign. Ukraine/Russia crisis were more prominent in media last week – in some countries (DE,BG,EE,LV) with pro-Russian feelings. It is interesting to see the main topics of the debate: DK “welfare turism” and social dumping, NL preservation of social welfare model, migration in IT, IE Sinn Fein criticising Brussels consensus, CY economic recovery and events in Syria, Turkey, Ukraine, FI against spending cuts, SE EU citizens of Roma origin, ES strong attacks to Markel – led austerity hawks”.
Comentários aos debates entre os candidatos presidenciais (o 1º debate)…
Comentários do meu correspondente e amigo Michael Shackleton sobre o primeiro debate Presidencial. O interesse desta análise reside sobretudo na grande capacidade crítica e intelectual de Michael, que em breve será apresentado na secção Os meus Convidados, professor em Maastricht, durante muitos anos funcionário europeu e co-autor do muito conhecido livro Parlamento Europeu. Eis como Michael comentou este primeiro debate (já lhe pedi a opinião sobre os seguintes):
(tradução livre): “Passei uma grande noite em Maastrich, no primeiro debate presidencial europeu. Se não o viram a noite passado no Euronews podem ainda encontrá-lo no website Europe Decides (nota euratória: e também neste blog, com o respectivo link). Não aprenderão muito sobre as políticas específicas dos candidatos mas terão uma visão clara de que tipo de pessoas são e quão bem estiveram no debate.
A ideia geral em Maastricht e nos eventos à margem organizados em praticamente todos os Estados-membros da União, incluindo 3 em Bruxelas e 3 em Paris e um em Washington DC, é que Verhofstadt foi o claro vencedor e Juncker esteve menos bem. Simplesmente não pareceu estar a divertir-se, enquanto todos os outros rejubilaram por estar rodeados por centenas de jovens estudantes.
Notável é que quase toda a gente considerou o debate interessante de seguir. Até os cínicos não o acharam aborrecido. Prevejo que será uma experiência a repetir, pois as pessoas gostam da oportunidade de identificar (possíveis) vencedores e perdedores. Tem de haver emoção, se queremos que as pessoas votem e a noite passado tive um vislumbre de um possível futuro. Duas questões foram suscitadas:
– o que sucederá nos próximos debates a 9 de Maio no Instituto Europeu de Florença e a 15 de Maio no Parlamento Europeu? Será possível haver verdadeiros debates sem interpretação? Tsipras não participou ontem porque não queria falar em inglês. Mudará de opinião no dia 15 do PE? Quanto ao Instituto, propõe que se use italiano e inglês? A seguir.
– em segundo lugar, influenciarão os debates a escolha do Presidente da Comissão? Na minha opinião, a imagem conta em política e não vejo o Conselho Europeu a designar Juncker se ele não tiver um melhor desempenho nos restantes dois debates. Não estou a dizer que Schulz ganhará o lugar mas afirmo que os debates podem prejudicar reputações. Quanto a Verhofstadt, a sua reputação como um potencial Presidente do Parlamento Europeu não foi prejudicada.
Chega destas incoerências mas sinceramente creio que o evento da noite passada foi muito mais interessante do que a discussão estéril no Reino Unido (nota euratória: Michael é inglês). (…)
O texto original:
I have just spent a great evening in Maastricht at the first European Presidential debate. If you did not see last night on Euronews or streamed, you can still see it on the Europe Decides website.
You will not learn much about the specific policies of the candidates but you will get a clear sense of what kind of people they are and how good they are in debate.
The general view in Maastricht and in side events organised in nearly every EU state, including 3 in Brussels and 3 in Paris, plus one in Washington DC was that Verhofstadt was the clear winner and Juncker performed the least well. He simply did not look like he was enjoying himself, whereas all the other revelled in being surrounded by hundreds of young students.
What has been very striking is that nearly everyone found it interesting to watch. Even the cynics did not find it boring. I predict that it is an experiment that will be repeated because people enjoy the chance of identifying winners and losers. There has to be emotion if you want people to vote and last night I caught a glimpse of a possible future.
Two questions now pose themselves:
– what will happen at the next debates on 9 May at EUI in Florence and on 15 May at the EP? Will it be possible to have real debates with interpretation? Tsipras did not come yesterday because he did not want to speak in English. Will he change his mind on the 15th at the EP? As for the EUI, they propose using Italian and English? Watch and see.
– second, will the debates influence the choice of Commission President? For me image counts in politics and I do not see the European Council nominating Juncker if he does not do well in the other two debates. I am not predicting Schulz will get the job but I do think the debates can lose you reputation. As for Verhofstadt, he has not done his reputation any harm as a potential President of the Parliament.
Enough of these ramblings but I honestly found last night’s event so much more enjoyable than the sterile discussion in the UK.
Enquanto isso, em Malta
Do meu convidado e amigo daquele país:
In Malta the result is almost definitely 3 PES and 3 EPP. A gain of 1 for EPP which is now in opposition. The PES government is seeking to be the first sitting government to win an absolute majority of votes in EP elections anywhere in Europe. Given its 55% win last year it might actually manage.
Tradução livre: “Em Malta o resultado é quase definitivamente 3 Socialistas e 3 PPE’s (esquerda, centro direita). Trata-se de um ganho de 1 para o PPE, que está actualmente na oposição. O governo socialista, PES, tenta ser o primeiro governo em funções a ganhar por uma maioria abosoluta de votos em eleições europeias em qualquer lado na Europa. Atendendo à sua vitória por 55% no ano passado, pode de facto ser bem sucedido”. Curioso é que a maioria absoluta – conforme confirmado pelo meu correspondente – não implica necessariamente um resultado distinto do empate em termos de número de mandatos.
Em Malta, quer o primeiro ministro, Joseph Muscat, quer o líder da oposição, Simon Busuttil, são antigos deputados europeus. O mesmo acontece com o vice-primeiro ministro Louis Grech e o das Finanças, Edward Sciclunam, numa demonstração de que em Malta a representação europeia é um passo para maiores responsabilidades, segundo Julian Vassalo, meu convidado e amigo, cuja apresentação poderão encontrar na secção Os meus Convidados, em breve.
Enquanto isso no Reino Unido
Eis o resultado das várias sondagens sobre as eleições europeias no Reino Unido. O UKIP – partido favorável ao abandono da União Europeia por parte do país – está à cabeça.
Eis o comentário do meu convidado inglês (ainda estou a aguardar que me autorize a identificá-lo, mas posso dizer que está no terreno, é um grande conhecedor da realidade e das matérias europeias):
“A grande história é o aparentemente invencível UK Independence Party. Apesar de candidatos estranhos, controversos e muitas vezes desacreditados, um registo de despesas e presenças lamentável no PE e um líder em campanha eleitoral populista, parecem capazes de mandar os Trabalhistas para o segundo lugar, os Conservadores para um lamentável terceiro e os Liberais para o esquecimento. Nenhum aspecto do escrutínio da imprensa sobre Farage (o líder do UKIP e actual eurodeputado) parece diminuir a sua popularidade”.
LEIAM O ARTIGO DE JEAN-QUATREMER: UMA ELEIÇÃO PRESIDENCIAL! : VER AQUI…
(original em francês, versões longa e curta)
Uma visão de esquerda, mas também uma perspectiva profundamente realista e informada das eleições europeias. Jean-Quatremer é um dos mais antigos e influentes correspondentes de assuntos europeus (em Bruxelas e para o Libération)
(tradução livre da euratória)
«O Parlamento Europeu? Não serve para nada, não tem qualquer poder! » «Porquê votar nas europeias? É a Comissão que decide tudo, e ela não é eleita! »
Que levante o dedo quem nunca ouviu um político, um jornalista ou o seu colega de escritório pronunciar estas palavras de desprezo… e inexactas! E contudo, a crise da zona euro demonstrou que a União passou a intervir a partir de então no mais íntimo das soberanias nacionais e que a cor política dos dirigentes europeus e de um Parlamento dotado de grandes poderes estão longe de ser indiferentes. A Grécia, Portugal, a Irlanda ou o Chipre, que sofreram curas de austeridade ditadas pela direita, podem testemunhá-lo.
Ora a eleição de 25 de Maio é uma estreia que vai permitir aos eleitores europeus escolher o futuro presidente do executivo da União, como numa democracia parlamentar funcional. A escolha política é grande : o luxemburguês Jean-Claude Juncker pelos conservadores, o alemão Martin Schulz pelos socialistas, o belga Guy Verhofstadt pelos liberais, o grego Alexis Tsipras pela esquerda radical, o francês José Bové e o alemão Ska Keller pelos Verdes. Só a extrema-direita e os eurofóbicos não indicaram ninguém, pois o soberanismo se presta mal à designação de um estrangeiro …
Contrariamente ao que afirmam os eurocépticos, não há uma « Europa liberal » gravada no mármore, mas liberais e conservadores que dominam a cabeça e os ombros da Comissão e do Parlamento Europeu desde 1999 (há 15 anos!). Deste modo, entre os 28 actuais membros do executivo, não há senão quatro socialistas no total… uma relação de forças que reflecte a do Conselho Europeu de Junho de 2009, sendo a designação dos comissários um exclusivo dos Estados. Ora esta democracia de segundo grau é justamente uma das críticas dirigidas à construção europeia.
E foi por isso que os partidos políticos europeus, inquietos com o desagrado das opiniões públicas a propósito da ideia europeia, organizaram um verdadeiro “Putsch” democrático em Dezembro de 2011: enquanto até então o Presidente da Comissão era escolhido em segredo pelos chefes de Estado e de governo, decidiram arrancar-lhes esse poder, comprometendo-se a designar cada um um cabeça de lista que seria, ao mesmo tempo, candidato à direcção do executivo europeu. E o que chegar à frente na noite de 25 de Maio, na óbvia condição de que reúna uma maioria política no seio do Parlamento (não há maioria automática, pois o escrutínio é proporcional) sucederá automaticamente ao conservador José Manuel Durão Barroso.
Os Estados, e nomeadamente a Alemanha e o Reino Unido, não apreciaram grandemente a manobra, pois os tratados europeus conferem-lhes o direito de escolher um candidato. Mas também prevêem que o Parlamento ratifique a escolha por maioria absoluta dos seus membros. Dito de outra forma, não ter em conta a dinâmica criada pelos partidos europeus é ir directamente de encontro à legitimidade e, portanto, à crise política. Mesmo Berlim começa a aperceber-se disso: como poderia a chanceler Ângela Merkel, que passa o seu tempo a reclamar mais democracia na Europa, ignorar a escolha dos eleitores?
É certo que isso não impediu Herman Van Rompuy, presidente do Conselho Europeu escolhido em 2009 pela sua sujeição aos governos, de afirmar há cerca de 15 dias «a diferença entre o Parlamento e aqueles que verdadeiramente decidem (isto é, os governos, NDR) é muito clara para os cidadãos». Resposta fulminante de Jean-Claude Juncker, também antigo primeiro-ministro: «o dentífrico democrático saiu do tubo com a eleição dos cabeças de lista para as europeias. Os tempos antigos em que o presidente da Comissão era eleito em salas esconsas por diplomatas acabaram!»
Resta dizer que a eleição do presidente da Comissão pelos cidadãos não resolverá inteiramente a questão democrática. Por uma parte, não será ele a escolher os comissários, mas os governos (um comissário por país); mas tem o poder, determinante para a orientação política da União, de distribuir os pelouros como entenda, tendo o Parlamento, in fine, de o ratificar, quer no que respeita à escolha dos comissários quer das suas atribuições. Ora o Parlamento mostrou bem no passado que não hesita em servir-se dessa sua competência. Por outro lado, se o Parlamento tem doravante os mesmo poderes que o Conselho de Ministro (que agrupa os Estados) em tudo o que diz respeito ao mercado interno a 28, isso não acontece relativamente às políticas económicas e orçamentais da zona euro: só uma reforma dos tratados poderia atribuir-lhe um tal direito de acompanhamento (“droit de regard”).
Mas, contando a maioria dos governos com socialistas no seu seio, a próxima Comissão será talvez maioritariamente de esquerda. Ou seja, o voto de 25 de Maio será primordial para aqueles que lutam por uma Europa menos liberal e mais social.
Comentário do dia
Presidência da Comissão: já há 3 candidatos!
Já há candidato a Presidente da Comissão Europeia por parte do partido liberal europeu: será Guy Verhofstadt. O presidente do partido anunciou que os dois candidatos – Verhofstadt e o nosso conhecido Olli Rehn – chegaram a acordo e que os dois conduzirão a campanha em pé de igualdade. Mas será Verhofstadt a concorrer ao lugar de Barroso; Rehn deverá concorrer pelo partido a um dos outros “lugares seniores dentro da União”, diz o comunicado de Graham Watson, presidente do partido. A confirmação acontecerá no dia 1 de Fevereiro.
Confirma-se assim o que escrevi aqui no dia 3 de Janeiro. E já há três candidatos ao lugar:
Martin Schulz, pelos socialistas, Alexis Tsipras, pela esquerda europeia e Guy Verhofstadt, pelos liberais. Ficamos à espera do Partido Popular Europeu (onde estão os deputados do PSD e do PP). Mas se tivesse de apostar, poria todo o meu dinheiro em Jean-Claude Juncker…