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E agora, Alemanha? E agora, Europa?

Em tempo…

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A senhor Merkel ganhou as eleições. E agora?

Dependendo, é claro, da coligação que se formar – e coligação haverá, quase inevitavelmente com o SPD -, o futuro da Europa começa a ser formatado a partir de agora.

A vitória de Merkel foi para muitos uma surpresa. E o facto de ter ficado tão perto da maioria absoluta, com um resultado histórico, é também um factor de perturbação e preocupação para aqueles que, e são muitos, continuam a insistir na “culpa” alemã relativamente a todos os males que nos afligem.

O problema português, é importante de uma vez por todas sintetizá-lo e resumi-lo, não apenas para o tentarmos entender mas sobretudo para o conseguirmos a) explicar e b) discutir, é um problema de dívida. Dívida: efeito de dever algo a alguém. Ora Portugal deve (aproximadamente, conforme as fontes) aos seus credores no exterior 130% de toda a riqueza que produz num ano (PIB) e as empresas portuguesas devem aos seus credores no exterior perto de 190% dessa mesma riqueza (os últimos números oficiais são de 2009). Qualquer coisa que não anda longe dos 500 mil milhões de euros. Por extenso:

 500. 000. 000. 0000.

 Como pagar? Sem “default” não há forma de o fazer. Nunca houve. Às vezes, os teóricos de todos os bordos fariam bem em revisitar a História, antes de analisar os factos, fazer prognósticos e previsões com base em modelos meramente teóricos que incorporam dados e fazem análises cujo único defeito é a sua alergia à realidade.

 A propósito do “default” – incapacidade de cumprimento das obrigações por parte de alguém ou de alguma coisa, nomeadamente de um Estado -, importa referir que as suas consequências (as consequências de não pagar parte ou até a totalidade da dívida) são muito grandes, afectam a economia desse país durante anos, décadas até, e têm com frequência consequências políticas. O caso de Portugal no final do século XIX é paradigmático: o nosso país arrastou por mais de cem anos as consequências do seu “default”, pagando-o em permanente instabilidade, na endemia da pobreza, em última análise no Estado Novo.

Que fazer, então? Acreditar na Europa como solução. Acreditar que nela, num conjunto externamente percebido como tal e com mecanismos reais de solidariedade e credibilização das partes pelo todo, há futuro. E a Europa, o projecto europeu e a zona euro em Portugal dependem em muito da Alemanha.

 Nos últimos anos habituei-me à gritaria que, em todos os quadrantes e pela pena de gente ilustre (não apenas, claro), atribuía aos alemães e à sua líder a responsabilidade pelos nossos males. Agora, quando finalmente se dobrou o cabo Bojador das tão aguardadas eleições clarificadoras da posição daquele país relativamente ao destino da União, os que gritavam suspendem a grita e, em conjunto com os outros, aguardam com expectativa o próximo futuro e o que a Alemanha estará disposta a fazer.

 Esperemos pois, juntos. Mas não silentes, mas não quietos. Portugal tem de activar como nunca a sua política europeia – a sua política externa – com uma comunicação activa, interventiva e eficaz, para explicar aos seus parceiros, e aos outros, o que tem feito, e o que conta fazer do que falta fazer. Tem se impor na negociação, tem de usar todos os seus activos nas instituições europeias, no Parlamento Europeu, na diáspora. Raramente o fez, não o fez sobretudo nos últimos meses, em particular depois da crise de nervos do verão (demissões no governo, iminência de eleições, remodelação no governo, governo), como hoje é patente nas taxas de juro implícitas das obrigações soberanas e nas ameaças das agências de rating.

Não o fez e devia ter feito, mas pronto, está feito e não se fala mais disso (se calhar, devia).

Em todo o caso, e cumprido o essencial requisito de finalmente agir na frente interna (da UNião) e externa (noutros aerópagos internacionais e através de uma diplomacia activa, sim, também económica), o que se espera da Alemanha, dos seus parceiros europeus, de Portugal, naturalmente, das instituições europeias, é que estabeleçam de vez os mecanismos de solidariedade e credibilização das partes pelo todo. Alguns dos passos para se atingir tal objectivo foram já dados, outros ainda terão de se concretizar. Eis em traços largos – que este post de retomada da Euratória vai longo – a agenda dessa consolidação fundamental da União dos europeus:

 – Prosseguir e concluir a união bancária

– Dar passos seguros na união orçamental

– Utilizar crescentemente os recursos europeus, com um orçamento europeu mais robusto e eficaz, capaz de gerar efectivos resultados na óptica de um espaço de livre circulação dos factores optimizado

– Reformular a governação europeia e os seus actores (a confusão dos chefes…)

– Dar um rosto e um cérebro unívoco à zona euro (união monetária)

– Gizar e, quando possível concretizar, formas de mutualização da dívida, isto é, permitir emissão de dívidas soberanas (nacionais) garantidas por toda a União, ainda que parciais. Importa dizer que o mais importante nesta matéria é o princípio, pois esse, se adquirido, comunicado e externamente percebido, será a pedra basilar do tal aspecto crucial da credibilização da Europa, da sua moeda única e dos próprios países em dificuldade.  

– Estabelecer respostas coordenadas para os países cujos stocks de dívida ultrapassam limites que não lhes permitem encarar o seu pagamento em termos e prazos razoáveis. É perdão, é “default”, dirão alguns e com razão, mas é sobretudo um redimensionamento à escala da União, garantido – contra os abutres da especulação que los hay – por ela, e em contrapartida de consolidações orçamentais programadas em conjunto e vigiadas por todos.

 Voltarei com tempo e espaço a este tema, naturalmente.

Entretanto, proponho um voto de confiança na nova Chanceler alemã. Os que já muito proclamaram não ter confiança nela – e na Alemanha em geral – podem estar renitentes mas… que alternativa propõe? Um “default” unilateral, infelizmente, é a única que existe.

Quem disser outra coisa, não está a dizer coisa com coisa.


1 Comentário

  1. Fernando de Sousa diz:

    Boa análise, Paulo. Escrevi isto, a propósito, no meu Facebook – “Uma boa análise do Paulo Sande. E afinal há aqui tanta coisa tão obvia que é dificil imaginar porque não se tornou já numa realidade. Creio que é por falta de visão política nas capitais europeias”. Abraço. Fernando de Sousa

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