Este é o terceiro de três posts sobre os orçamentos de que a União Europeia disporá nos próximos sete anos, sob a designação Perspectivas Financeiras Plurianuais (PFP), que mais não são do que um “tecto” para as despesas autorizadas: isto é, a União não poderá gastar mais do que os valores agora aprovados (sendo o agora uma incógnita, por ainda decorrerem negociações entre as principais instituições europeias, e desde logo entre o Parlamento Europeu e o Conselho).
Recordo o que escrevi no primeiro destes 3 textos: a União é responsável por menos de 2% do total da despesa pública europeia. As PFP deverão reduzir ainda mais o peso das políticas europeias.
Ora por vezes, ao discutirmos de que verbas devem os europeus dispor no âmbito da sua integração europeia, esquecemo-nos da existência de um quadro estratégico bem enunciado (tão bem enunciado quanto em risco de falhanço), a chamada estratégia 2020. Trata-se de definir um conjunto de objectivos para a União naquele horizonte temporal, baseado em:
Crescimento smart tendo por motor iniciativas como a Digital agenda para a Europa; Inovação e “Youth on the move” (políticas de apoio à mobilidade dos jovens). Recursos sustentáveis para uma Europa eficiente, incluindo uma política industrial para a era da globalização. E um crescimento inclusivo, com uma agenda para novas competências e empregos e uma plataforma europeia contra a pobreza.
Os “headline targets”, ou objectivos de referência para 2020, são cinco:
– Que haja 75% de pessoas entre os 20 e os 64 anos empregadas;
– Que 3% do GDP da União seja então investido em R&D; Clima: 20% de redução dos gases com efeito de estufa (pode chegar a 30%) em relação a 1990; 20% de energia proveniente dos renováveis e 20% aumento da eficiência energética
– Na educação, pretende-se reduzir o abandono escolar para menos de 10% e que 40% das pessoas entre os 30 e os 34 anos tenham o 3º nível de ensino.
– Que haja menos 20 milhões de pessoas na pobreza ou em exclusão social.
Era tendo em vista estes objectivos quantificados que a discussão devia estar a ser feita… mas não está.
Voltando às PFP, convém recordar algo que em Portugal parece cada vez mais fazer parte de algum mito urbano descartável e que é a persistência de verbas consideráveis à disposição do país para o seu desenvolvimento e a correcção dos desequilíbrios e assimetrias nacionais; a escutar muitos dos que escrevem diariamente sobre a União, parece que esta condenou o nosso país ao ostracismo e que nem mais um euro (europeu, passe a redundância) entra em Portugal como fonte de investimento para a recuperação da nossa economia. Parece, repito, a escutar tais trovadores, que a fonte secou definitivamente … ou que, pelo menos, muito boa gente a decidiu esconder atrás de um véu de esquecimento. Porque será?
Para dar uma ideia sobre o que estou a falar, recordo as verbas disponíveis para Portugal, no âmbito do QREN em vigor (período 2007-13): um total de 20,193 MM€ (com 2716 M€ em 2007 – 3058 M€ em 2013). A questão é pois simples: como utilizar o melhor possível esses recursos. Até porque (e aqui sim), as verbas para a política de coesão para Portugal deverão diminuir cerca de 10%.
O essencial é gastar melhor. Claro que me parece óbvio que os recursos disponíveis – aqueles que os Estados querem impor, em nome da austeridade -não são os adequados, quer quantitativa quer qualitativamente, para a situação que vivemos.
Mas mais do que o valor, efectivamente pouco consistente, há também necessidade de melhorar as condições da eficácia do orçamento europeu – e do seu planeamento de longo prazo. Por exemplo:
Ter em conta as situações de investimento menos eficiente, como no caso de haver falhas de mercado; garantir o valor acrescentado da União e o efeito multiplicador da sua intervenção, tentando mobilizar investimentos várias vezes superiores; acumular capital com rendimentos e pagamentos usados de novo no período de programa, (como exige o PE); assegurar transparência na orçamentação, na delegação de gestão, na atribuição de fundos, na monitorização da implementação, harmonização e simplificação; racionalizar e integrar os instrumentos financeiros que visem produtos similares. Resumindo, trata-se de aprofundar uma visão integrada entre os instrumentos e o valor-acrescentado europeu e os instrumentos similares utilizados ao nível nacional/regional, muitas vezes co-financiados por fundos estruturais.
Quanto às fontes de rendimento que respeitam às receitas próprias da EU, existem muitas propostas: um IVA “europeu” e uma percentagem da taxa sobre as transacções financeiras. O PE defende uma reforma aprofundada do sistema de recursos próprios que reduza a quota de contribuições baseadas no Produto Nacional Bruto (PNB) para o orçamento da UE a um máximo de 40% e extinga gradualmente as deduções e mecanismos de correcção existentes. A importância de uma reforma profunda do sistema de recursos próprios tem também a ver com aspectos identitários, visando uma União que sirva os cidadãos, com obrigações e direitos de parte a parte.
Em suma, a Europa precisa de aprofundar a sua integração. E isso passa pelas PF plurianuais. Não porque queira gastar mais, mas porque precisa de gastar melhor. As políticas europeias só são uma mais valia quando beneficiam todos em conjunto.