O futuro da Europa: que meios?
A Universidade Católica – o CESOP (centro de sondagens), em associação com o Instituto de Estudos Políticos e o Departamento de Ciências Sociais e Humanas daquela Universidade – está a terminar um estudo sobre a opinião dos portugueses a propósito da questão “de que meios dispomos para o futuro” da União Europeia. Hoje foram apresentados alguns dados relevantes do estudo, quase a concluir-se, com muitas conclusões interessantes.
Nesse contexto, e tendo em vista uma intervenção num seminário organizado para o efeito, fiz uma pequena reflexão sobre o tema. Num contexto de crise e o enquadramento da União Europeia, o enfoque do estudo, do seminário e desta minha análise, é então o próximo quadro financeiro da União Europeia: é suficiente? De onde vêm (ou devem vir) os recursos?
De que meios dispomos para o futuro?
E comecei, naturalmente, pelas perspectivas financeiras (PF) para os próximos 7 anos (2013-2020). São 3 as questões principais a ter em conta: O valor total das despesas; as rubricas das despesas; e as fontes de rendimento, ou seja, os recursos disponíveis.
Começando pelo valor total das despesas as últimas PF (entre 2007 e 2013) foram de 994 mil milhões € (994.000.000.000 euros); a proposta do Conselho para as próximas é de 959 mil milhões (MM) €. Seria a primeira vez desde 1988 que as PF são inferiores às do período anterior (seria, porque o Parlamento Europeu não aprovou a proposta do Conselho e está em curso uma negociação entre as duas instituições; mas é expectável que não haja grandes mudanças no que podemos chamar “os grandes números”).
Quanto às rubricas das despesas, verifica-se um aumento sector a sector, com mais 37,3% de verbas previstas para a rubrica da competitividade para crescimento e empregos e 1% para o crescimento inteligente e inclusivo. Mas como a manta não estica – e foi encurtada, ela diminui noutras rubricas: o maior corte é no crescimento sustentável, incluindo a PAC e a coesão económica, social e territorial que leva um corte de 29,7 MM€, ou seja menos 8,4%. Eis os números, como apresentados pelo próprio Conselho:
Novas PF 14-20 | Últimas PF 07-13 |
Comparação 2014-20 v. 2007-13 |
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Dotações para compromissos | Milhões € | Milhões € | € | % |
1. Crescimento inclusivo | 450.763 | 446.310 | +4,5MM | +1,0% |
1a. Competitividada para crescimento e emprego | 125.614 | 91.495 | +34,1MM | +37,3% |
1b. Coesão económica, social e territorial | 325.149 | 354.815 | -29,7MM | -8,4% |
2. Crescimento sustentável: recursos naturais | 373.179 | 420.682 | -47,5MM | -11,3% |
3. Segurança e cidadania | 15.686 | 12.366 | +3,3MM | +26,8% |
4. Europa Global | 58.704 | 56.815 | +1,9bn | +3,3% |
5. Administração | 61.629 | 57.082 | +4,5bn | +8% |
6. Compensações | 27 | n/a | +0,027bn | n/a |
Total dotações para compromissos | 959.988 | 994.176 | -35,2bn | -3,5% |
Como % do PNB | 1,00% | 1,12% | ||
Total dotações para pagamentos | 908.400 | 942.778 | -34,4bn | -3,7% |
Como % do PNB | 0,95% | 1,06% |
Preocupante nesta proposta é o prolongamento do fosso dos recursos alocados a título de autorização – isto é, aqueles com que a União se pode comprometer para cada um dos anos em causa – e a título de pagamentos, isto é, a verba efectivamente disponível para despesas. Assim se cria um verdadeiro défice europeu, como se viu no final do ano passado quando a União não dispôs de recursos para honrar todos os seus compromissos e o orçamento anual não pôde ser desbloqueado de imediato.
A propósito da recusa do PE de autorizar estas PF como se apresentam, resumo o essencial da posição da instituição: o Parlamento tinha apelado ao Conselho para que aprovasse um orçamento (PF) que promovesse o crescimento. O QF plurianual (QFP) proposto vai no sentido oposto. Os pontos principais que os deputados querem ver contemplados são: não ao já referido défice estrutural, isto é, à acumulação e recondução dos pedidos de pagamento no orçamento comunitário. Flexibilidade, revisão obrigatória, recursos próprios: a equipa de negociação do PE conduzirá as negociações sobre um pacote global que inclua uma revisão obrigatória do QFP a meio da sua vigência (já com o novo PE e Comissão), flexibilidade na utilização das verbas entre rubricas entre e um acordo sobre os recursos próprios. Transparência: qualquer votação sobre o QFP deve ser feita “de maneira aberta e transparente”. Se não houver acordo sobre o QFP até ao final do ano aplicar-se-ão os limites máximos previstos para 2013 ajustados à inflação. “Não há acordo sobre nada até que haja acordo sobre tudo”, conclui o PE.
Em breve colocarei um novo texto sobre a razão principal para esta querela entre os deputados eleitos e o Conselho Europeu (onde se sentam os chefes de Estado e de governo). Porquê estes cortes e porquê esta pressão?
Até já!